*
( Ao amigo “Tuco” Amalfi-----------------
pintor, poeta, mago das cores-----------------
pai das impossibilidades )-----------------
*
trancar porta
e outra
se preciso for
abrir espaço
e outro
caso convenha
viver a vida
dos homens
manter o método
cabresto e rima
mas banir o sopro
do incondicional
: o vôo branco----------------
da ave nova----------------
o sonho inveja----------------
*
( Para Neiva Guedes, bióloga,++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
mãezona da Arara Azul++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
amiga da humanidade++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
baleia de luz )++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
*
*
O pequenino Sexta-Feira
morreu numa manhã nublada
após doze dias comendo goiaba
e enchendo a casa de alegria
*
*
Caído do ninho quase sem penas
o bichinho minguava
no fio do asfalto
e piava de frio na noite medonha
*
*
Desolado !
*
*
Desolado
e sem remédio
como um pontinho
a carvão
( feito por alguma criança incauta )
a flutuar
no meio do mar:
*
.
*
*
Quis compreender
o que projetava
o breu e o vento e o lobo da fome
a um bebê gaturamo
que perdeu a estribeira
numa quase primavera
mas nas horas
de apuro
a cachola humana
é só um poço de limites
*
Bem...
quis o destino
que eu precedesse
o gato
e então dei-lhe um ninho
improvisado, chinfrin
numa caixa de sapatos
*
E quero crer que por doze dias
Sexta-Feira foi feliz
*
*
Aqueci-o com lâmpada
e alimentei-o no bico:
banana, goiaba
pêssego, mamão
e cada pio
do bichinho
nutria meus minutos
e cada chilro
abrir de bico
davam-me a ilusão
de ter na alma
uma baleia
de luz
*
*
Sexta-Feira aos poucos
foi emplumando
e, de pena em pena
mostrou-me
que o cerne do mundo
está nas coisas simples
nas coisas esquecidas
não reivindicadas
*
*
Miudinho, morno
tagarela
e com o olhar suplicante
de quem só tinha a mim
deitou em minhas mãos
seu próprio destinozinho
*
*
Da forma mais cega
confiou
Como mulher nenhuma
nenhum parente
nenhum amigo
ousara tanto confiar
*
*
Mas um dia
- numa manhã de sábado-
Sexta-Feira amanheceu calado
*
*
O sábado não se deu
a Sexta-Feira
e todo o alento do universo
petrificou, miudamente
na caixinha de sapatos
*
*
Tentei reanimá-lo
assoprei sua bundinha
implorei ao Deus Abrâmico
a Hera, Cernunos, Brán
- mas nada disso adiantou
*
*
Enterrei meu filho
no jardim
à sombra de uma árvore
camuflada por filodendros
*
*
Naquele sábado
guardei luto
*
*
No domingo
não quis prosa
*
*
A segunda
foi tão vazia
*
*
E na terça
uns idiotas
derrubaram as duas torres
de Manhattan
pra protestar
contra a idiotice humana
*
*
E eu resolvi
escrever
esta estória
mesmo com essa coisa
nos olhos
que é pra fazer a vez do canto
que Sexta-Feira não cantou
Nenhum comentário:
Postar um comentário