sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

LEVEZA

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Antônio B., um Camaleão de Saias
e o Fantasma de Hester Prynne

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(...) “Isso não impede
que Simone de Beauvoir
tenha sido a primeira
a mostrar que a masculinidade
não estava restrita aos homens,
que ela é um signo racial e cultural
acessível a todos.
E isso é absolutamente revolucionário”.
- Marie-Hélène Bourcier -
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"O homem é o que ele come"
- Ludwig Feuerbach -
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"Diga-me o que comes,
dir-te-ei quem és
- Brillat-Savarin -
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Antônio B., que sequer bebia
numa só noite
conheceu uma santa
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apaixonou-se
pela Sra. Bovary
que se continha

debaixo de sua túnica
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fornicou com uma tal de Xavierine
que demonstrou dominar a arte
a fundo
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adormeceu a par
d’uma caveira

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e acordou com Hitler soltando puns
e penteando o bigodinho
no travesseiro ao lado
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Na tarde seguinte
depois de uma breve chuva
quando as andorinhas, em vôos tortos
caçavam siriris antes que a noite desabasse
teve sua cabeça decepada por um soldado
tártaro
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Hoje, sua cabeça glabra e polida
que lembra o gomo esquerdo de la sedere de La Gioconda
faz parte do acervo do Museu da Imbecilidade Humana
/ onde /
ao lado de uma adaga fálica
é vista com cinco letras escarlates na testa:
BURRO
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Matinê Dominical
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( Para Jacques Prévert )
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"Estamos todos condenados
a uma reclusão solitária
no interior de nossa própria pele"
- Jean Genet –


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Estranha
............dissimulada
..............................contenda
...........................................a das velhas
...................................................na escadaria da igreja
....................................................................................depois da missa
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Há pouco de voltarem ao nada
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Os dias iguais
o passado salobro
danadas quaisquer reminiscências
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A maioria viúva de um marido só
( - “nunca mais”: promessa ao lado do morto - )
algumas virgens, sacripantas
confusas, secas, gorduchas
..............................sem nexo
nas manhãs de domingo
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As que sonharam amor só souberam carícias
as que plantaram legume mal colheram premissas
jamais se casaram
as que cuidavam das flores
nenhum vazio
se farta
há eras
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As velhas:
coagulam-se em pequenos grumos
no granito
cada uma a julgar-se a mais beata
....................................a mais etérea
naquela timidez arquitetada
puro fasto
em cores sóbrias
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Falam dos finados maridos e seus cacoetes
do parente que o vizinho esqueceu no manicômio
de um sapateiro coxo.............................extraviado
em vãos de pernas
de afilhadas envergadas na bolina
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E toda sorte de escalda-rabo
se desfia
enquanto elas, serviçais da fé
prosseguem orgulhosas
....................de uma faina de lida
....................de seus filhos generosos
...................................com diplomas de magistério
apesar do diabetes
das úlceras varicosas
do dinheiro magro das pensões
da angorá de uma espanhola
.................................peituda
que faz escândalo
nos porões
sarapintando a noite com desgrama
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Apontam os defeitos do mundo
com uma lia de hóstia
colada às dentaduras
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e enquanto a praça da igreja
se murcha intimidada
cada pedrinha
........................mas cada pedrinha
........................condenada ao sol
espia suas calçolas
e silencia
........................como nunca
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... .. .. . . ... . ... .. ... .. ..... .. . . . . ..
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Um comentário:

Kátia Torres disse...

Sem palavras. Sutileza em tudo. Isto é saber dizer!

Melhor partir. Deixá-lo com suas palavras. Recolher-me.

Kátia.